quinta-feira, novembro 13, 2014

8. Rocha/Desenhamento



...e depois do adeus, os últimos sobreviventes, cada vez mais escassos, encaminharam-se para sul, sem bússola nem mantimentos. Eram grupos cinzentos na paisagem de todas as distâncias. Nos primeiros dias dormiram, no acaso das concavidades do terreno, com algum conforto. As velhas tendas ainda prestavam esse serviço ou os sacos-cama de tons desbotados.
Após marchas sem fim, enterrando os mortos que marcariam o horror daquele êxodo, vinte ou trinta pessoas avistaram Korys, grande metrópole que atraíra sempre povos longínquos, dedicando às indústrias da reciclagem todo o seu poder.
Os sobreviventes tentaram explorar as propriedades ainda visíveis naquele monstro de torres que se desfaziam na alta e espessa atmosfera. O último par de binóculos, nas mãos dos homens mais velhos e mais sábios, permitiram escrutinar aquele mundo e verificar que ali já não havia vida há muito, muito tempo. 
Rocha de Sousa

3 comentários:

Justine disse...

Não consigo ligar a frase senão à nossa história recente, apesar do texto que escreves sobre o 11 Setembro ser adequado...

Licínia Quitério disse...

Apocalíptico. Korys como o pior dos mundos. Sem dúvida um alerta para os caminhos de hoje.

bettips disse...

Fui procurar "Korys" e apareceu-me uma colmeia/favos de mel dourados.
O que ainda torna mais dramática a tua imagem e me remete as tuas palavras para o abandono de qualquer cidade colonial.
Ou das guerras actuais em que os edifícios se esboroam e as pessoas parecem sonâmbulos sem cor. Uma perspectiva crua e desamparada, um tema da(s)guerra(s). Onde muitos nem tiveram tempo de dizer "adeus".