quinta-feira, novembro 08, 2018

9. Mónica



Quando eu era pequena tinha uns medos que faziam rir a família e enquanto os meus pais foram vivos eram repetidos à mesa de família, nos natais, entre amigos, para entreter. Tinha medo de botas altas (botas altas quer dizer botas de cano alto) e medo do Pai Natal, e os dois juntos, o Pai Natal calçado de botas altas, claro, era o pavor, recusava-me a olhar, agarrava-me à minha mãe ou ao meu pai, fechava os olhos e dizia que não queria ver. Numa ocasião os meus avós foram passar uns dias a nossa casa, o meu avô usava botas altas em trabalho, o que não era o caso porque se estava em nossa casa era porque estava em trânsito ou de visita, mas todos os dias o raio das botas tinham que ser engraxadas e o empregado punha-as à porta da entrada da zona dos quartos e eu precisava de passar por ali várias vezes, que angústia, encostava- -me rente à parede e desatava a correr para a cozinha. Nessa ocasião as botas serviram para me ameaçar caso não comesse a sopa, come a sopa senão vou buscar as botas do avô. Ou isso ou ter a colher de pau no canto da mesa. Mesmo depois dos meus avós irem embora, de vez em quando saíam-se com essa, come a sopa senão vou buscar as botas, e eu pensava que tolos são, as botas já não estão cá! Lembrei-me desta história e fui à procura de uma fotografia minha quando era pequena e encontrei uma em que estou de galochas e pensei então e a história do medo das botas altas? 
Mónica

6 comentários:

Isabel disse...

A história é engraçada e a menina da fotografia é muito bonita:))

Anónimo disse...

Lembro-me de outras pessoas também com medo de botas altas. Haveria qualquer ligação às Guerras Mundiais que uns viveram e outros ouviram contar aos seus pais? (Luisa)

Anónimo disse...

Uma miúda muito gira.

Teresa

M. disse...

As coisas de que os adultos se servem para "dominar" as crianças!...

Justine disse...

Ah, mas galochas não são botas altas. As ditas têm de ser de cabedal lustroso de graxa! E ao ler a tua história lembrei-me de um quadro da Paula Rego onde se vê uma figura fardada e com botas altas, sentada numa cadeira onde foi atado um cordeiro; em segundo plano, uma mulher seminua. Quadro assustador, ameaçador, justificativo do teu medo de botas altas!

Licínia Quitério disse...

Os nossos medos podem revesir tantas formas, até de umas botas altas. Interessante esta memória.