quinta-feira, dezembro 26, 2019

AGENDA PARA JANEIRO DE 2020



Dia 16 - Com as palavras dentro do olhar sobre fotografia de Zambujal.

AGENDA PARA JANEIRO DE 2020

Proposta de Zambujal
Dia 2 - Ao jeito de cartilha: Proponho-vos que usemos a sílaba “mor para formar as nossas palavras. O foco tem de estar todo, e apenas, na ligação entre a palavra que escolhermos para a sílaba proposta e a fotografia que a expressará, quer se trate de um objecto ou de um conceito.
Dia 9 - Reticências com a frase “ Já cá faltava” a iniciar o texto. Não esquecer a fotografia.
Dia 16 - Com as palavras dentro do olhar sobre fotografia de Zambujal.
Dia 23 - Jornal de Parede
Dia 30 - Fotografando as palavras de outros sobre
(…)
pobre mulher,
só conseguia executar uma tarefa se a descrevesse enquanto a praticava, se lavava a roupa dizia agora estou enxaguando primeiro, botando sabão e esfregando rugosa na pedra, agora molho outra vez, até a água sair limpa, agora desamarroto, torço e ponho secando no varão, primeiro uma mola, depois esta e mais dez para o vento não puxar, o vento estica, enrodilha, embaraça, estorce, arranca e rouba a roupa, mas não a quer para ele, é maldade, só a revoluteia no ar, para a jogar fora mais adiante, surripia sem proveito, o vento é só para irritar a gente, e corria atrás dos trapos, e dizia agora estou pondo um pé à frente e tudo o que lhe vinha à cabeça. (…)

O Gesto Que Fazemos para Proteger a Cabeça, Ana Margarida de Carvalho

O DESAFIO DE HOJE

Proposta de Justine

NATAL, um lugar nas nossas vidas

26 de Dezembro – E para o ano... há mais Natal? (texto, ou foto, ou ambos - opcional )

7. Zambujal



Decerto no dia 25 de Dezembro será
De certo – a haver…como haverá – será 6ª feira
porque 2020 é bisexto[i]
De certo não será Natal em todas os países e casas[ii].
Decerto haverá palavras de esperança
e sopas de conforto para os sem abrigo
De certo já não o viverão muitos
dos que vivos estão neste Natal de hoje
De certo haverá crianças a nascer nesse dia
Decerto algumas se chamarão Jesus.

Zambujal

(25.12.2019)

[i] - vê-se em agenda amorosamente oferta como prenda de aniversário
[i] - dos 30 países seleccionados na agenda (por que critério?), em 2 o dia não é feriado (Eslováquia e Turquia)

6. Rocha/Desenhamento



O mercado de trabalho está em mudança de acordo com as pressões técnicas, culturais e sociais. Está em alteração e isso implica novos caminhos nas ideias e informação de sentidos, além de novas mitologias: o Natal, por exemplo, hoje vivido mo caminho de um ser presenteiro (Pai Natal) que despeja sobre o mundo e as crianças um céu de coisas aliciantes, por vezes quase perto da encomenda feita em sonhos de infância e jogos ou partidas.
O futuro parece travar esse tipo de devaneios e fazer evoluir as curiosidades para saudações com mais severo conteúdo. No entanto, a crise climática, a par das convulsões entre diversos grupos humanos, no quadro de milhares de diferenças e diversas intenções de modo e ser, surgem mudanças quanto a direito de cada um e todos, na vida e nos seus valores.
Haverá pressupostos mais vastos quanto à antropologia, numa perspectiva de amplo enlace entre povos, almas e culturas.
A inclusão contra a exclusão - no futuro?

Rocha de Sousa

5. Margarida



Mais singelo, talvez...

Margarida

4. M.



Se para o ano haverá mais Natal não sei, essa é uma das perguntas que todos nós fazemos em relação ao futuro e para a qual não temos resposta segura, por causa da finitude humana versus permanência ou renovação da vida. Uma coisa sabemos de certeza e foi David Mourão-Ferreira que a deixou escrita com palavras muito belas no início da sua Ladainha dos Póstumos Natais: «Há-de vir um Natal e será o primeiro/em que se veja à mesa o meu lugar vazio». Mas, haja ou não mais Natal para o ano, a Natureza enfeitar-se-á como de costume e confortará quem a sentir como fazendo parte de si.
M

3. Licínia

Estou para aqui a pensar em certos natais que inventei para que, em anos brutos da implantação do consumismo, eu pudesse apresentar alguma coisa que dissesse que as lojas não vendem o melhor que temos e pode a outros servir. Natais em que fui pai-natal, mãe-natal, filha-do-pai-natal e até rena, quando não havia ainda chifres à venda, mas foram feitos cá em casa. Nesse tempo havia crianças que eram o meu público mais atento. Nesse tempo eu acreditava que a febre das compras havia de se extinguir, que as crianças haviam de crescer para um mundo menos fútil, mais útil, mais amável. Foram esses natais que hoje recordo, e há um doce-amargo nesta lembrança de mim, dos que já não estão, das minhas ilusões que afinal continuarei a alimentar, em qualquer Natal, esteja eu onde estiver.
 

Licínia

2. Justine



Se para o ano houver crianças que mantenham a sua ingenuidade e continuem a fascinar-se com as iluminações das ruas, sem apreenderem o seu sentido último; se para o ano houver famílias que continuem a escolher esta época para encontros e reencontros entre amigos e parentes; se para o ano ainda houver gente tolerante e aberta que continue a achar encantadoras as recriações de pequenas aldeias a que chamamos presépios, com musgo a desenhar caminhos e um berço de palhas com um bebé deitado; se para o ano as ruas e montras forem de novo palco e chamariz de consumos, para onde as gentes são empurradas quase compulsivamente; se para o ano ainda houver quem acredite que nesta época se festeja o nascimento de um menino que alguns consideram filho de deus e outros um profeta nascido na Judeia; se tudo isto acontecer…então sim, para o ano há mais Natal!
Justine

(fotografia de uma ilustração de Alex Gozblau, no artigo O Burro do Presépio e todos os outros, de José Tolentino Mendonça, Revista E de 9/11/2019)

1. Agrades


 
Sei lá!
Nem sequer sei se haverá ano, quanto mais Natal...

Agrades

sexta-feira, dezembro 20, 2019

DA BETTIPS PARA A FAMÍLIA PPP



Que o vosso semáforo esteja sempre verde para os nossos encontros semanais e as estrelas das ideias brilhem à vossa medida em épocas de festa. 
Bettips

DA AGRADES PARA A FAMÍLIA PPP



A mensagem que a Agrades enviou por email para todos nós:

«Fiz há dias um cartãozinho de Boas Festas que junto para ti e tua família bem como para a família PPP.
Que a saúde e os afetos não nos falhem, é o voto maior para estes e outros dias.
Beijinho
Agrades»

quinta-feira, dezembro 19, 2019

AGENDA PARA DEZEMBRO DE 2019

Proposta de Justine

NATAL, um lugar nas nossas vidas

26 de Dezembro – E para o ano... há mais Natal? (texto, ou foto, ou ambos - opcional )

O DESAFIO DE HOJE

Proposta de Justine 
 
NATAL, um lugar nas nossas vidas

19 de Dezembro – A literatura e o Natal (só texto/só foto ou ambos - opcional)

11. Zambujal


   
       O Germano diz que já lá tem o bolo-rei – grita o pai, pousando o telefone no descanso.
Está bem – respondeu a mãe, da cozinha, onde, ajudada por Eurídice, ultima os preparativos para a ceia.
Frita, agora, as últimas rabanadas que junta às primeiras numa travessa oval, depois polvilha-as com uma mistura de açúcar e canela: Pronto, os doces estão, só falta o bolo-rei – faz uma pausa, passa as mãos por água na torneira do lava-louça e enxuga-as na ponta do avental, deita um olhar ao relógio de parede suspenso por cima do frigorífico, e acrescenta: Já passa das sete, o melhor é ires buscá-lo não vá o senhor Germano fechar a pastelaria, com ele nunca se sabe…
Eurídice sorri e acena a cabeça. (…)

(Começo de Aquela Noite de Natal, de José Casanova, editora Caminho)

10. Teresa Silva

9. Rocha/Desenhamento



Ao lembrar-me de certa obra de Charles Dickens, UM CONTO DE NATAL, onde este grande escritor leva à abordagem de Ebenezer Scrooger, avarento por natureza, mostrando-o visitado por três notáveis personalidades que o vão convidar a reflectir sobre a..generosidade. Então ocorreu-me abrir à sorte o último livro que publiquei O MESSIAS página 13, número bizarro. Lá, um tal José diz a certa altura o seguinte:
«Como dono da minha humanidade, e ao ouvir tais acusações, nunca poderei sentir-me magoado, tendo pena de mim, porque se algum aspecto relevar da minha militância verdadeira pelas causas do Homem, o problema não residirá em nenhum retrato, em nenhuma vaidade autoral, ainda que possa desvendar um pouco do meu desejo, sobretudo na multiplicação do ver sensato e no desdobramento do sentido das palavras. As pessoas não estão nos retratos. Eu nunca vi o Outro que não foi Ninguém.»
Rocha de Sousa
Imagem (fragmento da capa do livro)

8. Mónica

"Chegara ali no dia de Natal e constatara, com uma mistura de pasmo e comiseração, que o comandante da corveta, Álvaro Andrea, tinha convertido o aquartelamento num lugar de celebração cristã. Chapas de zinco tinham sido usadas para servir de tampos de mesa e troncos foram convertidos em assentos. Cartucheiras vazias e fitas de metralhadoras enfeitavam uma árvore no centro do recinto.
Aquela fantasia natalícia surgia patética aos olhos do capitão de cavalaria. E revelava não uma particular devoção cristã mas uma perigosa fragilidade. Se os chefes militares fossem pelo caminho da encenação, cedo os soldados pediriam mentiras maiores. Para acertarem naquele fingimento de Natal faltava-lhes o frio, a neve e os cheiros da sua terra. Em contrapartida sobravam os mosquitos, as febres e os odores fétidos do pântano."

Volume III "O bebedor de horizontes" (pág. 34 e 35) da trilogia "As areias do Imperador" de Mia Couto, Fundação Fernando Leite Couto.

7. Mena M.

6. Margarida



(uma biblioteca em Amsterdam, vista de cima, num Dezembro qualquer 
de um qualquer ano da graça, não há muito.
                        A fazer lembrar uma árvore de Natal)
Margarida

5. M.



TOADA DE NATAL

Um pássaro a cantar na laguna estagnada
Frutos no capitel de uma coluna exangue
É assim que o Natal se nos pousa na alma
É assim que o Natal tem um gosto a laranja

Do gira-discos sobe um concerto de Bach
Que importa que lá fora o vento se levante
É assim que o Natal habita a nossa casa
É assim que o Natal desperta a nossa infância

Mas penso no que seja a noite de hoje em Praga
Vais a dizer Jesus e dizes Vietname
É assim que o Natal nos dilacera a carne
É assim que o Natal nos parece um alfange

E ficamos os dois de mãos entrelaçadas
E filtramos a luz e a sombra deste instante
É assim que o Natal nos vai enchendo a taça
É assim que o Natal nos aperta a garganta

1968

David Mourão-Ferreira, Obra Poética 1948-1988 (Cancioneiro de Natal 1960-1987, páginas 226 e 227), Editorial Presença, Julho de 1996

4. Luisa

3. Licínia



NATAL, E NÃO DEZEMBRO

Entremos, apressados, friorentos,
numa gruta, no bojo de um navio,
num presépio, num prédio, num presídio,
no prédio que amanhã for demolido...

Entremos, inseguros, mas entremos.
Entremos, e depressa, em qualquer sítio,
porque esta noite chama-se Dezembro,
porque sofremos, porque temos frio.

Entremos, dois a dois: somos duzentos,
duzentos mil, doze milhões de nada.
Procuremos o rastro de uma casa,
a cave, a gruta, o sulco de uma nave...
Entremos, despojados, mas entremos.
Das mãos dadas talvez o fogo nasça,
talvez seja Natal e não Dezembro,
talvez universal a consoada.

David Mourão-Ferreira, Obra Poética 1948-1988 (Cancioneiro de Natal 1960-1987, páginas 222 e 223), Editorial Presença, Julho de 1996

2. Justine



Dia de Natal

Hoje é dia de ser bom.
É dia de passar a mão pelo rosto das crianças,
De falar e de ouvir com mavioso tom,
De abraçar toda a gente e de oferecer lembranças.

É dia de pensar nos outros – coitadinhos – nos que padecem,
De lhes darmos coragem para poderem continuar a aceitar a sua miséria
De perdoar aos nossos inimigos, mesmo aos que não merecem,
De meditar sobre a nossa existência, tão efémera e tão séria.

Comove tanta fraternidade universal.
É só abrir o rádio e logo um coro de anjos,
Como se de anjos fosse,
Numa toada doce,
De violas e banjos,
Entoa gravemente um hino ao Criador.
E mal se extinguem os clamores plangentes,
A voz do locutor
Anuncia o melhor dos detergentes.
Nas lojas, na luxúria das montras e dos escaparates,
Com subtis requintes de bom gosto e de engenhosa dinâmica,
Cintilam, sob o intenso fluxo de milhares de quilovates,
As belas coisas inúteis de plástico, de metal, de vidro e de cerâmica.
A Oratória de Bach embruxa a atmosfera do arruamento.
Adivinha-se uma roupagem diáfana a desembrulhar-se no ar.
E a gente, mesmo sem querer, entra no estabelecimento
E compra – louvado seja o Senhor! – o que nunca tinha pensado comprar.

Mas a maior felicidade é a da gente pequena.
Naquela véspera santa
A sua comoção é tanta, tanta, tanta,
Que nem dorme serena.

Cada menino
Abre um olhinho
Na noite incerta
Para ver se a aurora
Já está desperta.
De manhãzinha
Salta da cama,
Corre à cozinha
Mesmo em pijama.

Ah!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

Na branda macieza
Da matutina luz
Aguarda-o a surpresa
Do menino Jesus.
Jesus,
O doce Jesus,
O mesmo que nasceu na manjedoura,
Veio pôr no sapatinho
Do Pedrinho
Uma metralhadora.

Que alegria
Reinou naquela casa em todo o santo dia!
O Pedrinho, estrategicamente escondido atrás das portas,
Fuzilava tudo com devastadoras rajadas
E obrigava as criadas
A caírem no chão como se fossem mortas:
Tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá
Já está!
E fazia-as erguer para de novo matá-las.
E até mesmo a mamã e o sisudo papá
Fingiam
Que caiam
Crivados de balas.

Dia de Confraternização Universal
Dia de Amor, de Paz, de Felicidade,
De Sonhos e Venturas.
É Dia de Natal.
Paz na Terra aos Homens de Boa Vontade.
Glória a Deus nas Alturas.

(excerto do poema Dia de Natal de António Gedeão)

(fotografia de uma escultura numa exposição no MAAT)

1. Agrades

segunda-feira, dezembro 16, 2019

A PEDIDO DA JUSTINE

Olá Manuela
Acabei de ler as histórias de Natal que cada um/uma de nós achou por bem, e gostei muito, é um mosaico de sensibilidades bonitas. Fiz um comentário colectivo, que deixei no texto que postaste sobre a questão dos sublinhados. Achas que podes publicá-lo de modo que todos o leiam?  O comentário é o seguinte:

Cada um de vós , com a enorme sensibilidade que vos caracteriza , contou histórias vividas ou inventadas, não interessa. Apenas interessa que são histórias lindas, cheias de humanidade, ternura e ensinamentos. Eu também gosto muito do que conto na minha história 😊
Somos um grupo fantástico, não é verdade?
Boas Festas!

Beijinhos

quinta-feira, dezembro 12, 2019

AGENDA PARA DEZEMBRO DE 2019

Proposta de Justine

NATAL, um lugar nas nossas vidas
    
19 de Dezembro – A literatura e o Natal (só texto/só foto ou ambos - opcional)

O DESAFIO DE HOJE

Proposta de Justine

NATAL, um lugar nas nossas vidas

12 de Dezembro – A história de Natal que eu contaria (texto e foto)

NOTA:
Peço-vos desculpa por hoje alguns textos terem ficado meios loucos, com frases assinaladas a branco sem que eu as desejasse assim, mas não consegui modificá-las. Tentei várias vezes, desliguei o computador, voltei a ligá-lo, experimentei voltar a publicar os tais textos, aquelas frases rabinas continuaram a desobedecer-me... Desisti. Mas se alguém souber dizer-me como remediar este contratempo, por favor elucide-me.
M

11. Zambujal



A HISTÓRIA DE NATAL QUE EU CONTARIA
Era uma vez… 
Era uma vez uma criança. Que nasceu ao calor da lareira, entre duas idas da mãe à vinha. Nasceu no mesmo ano, só uns dias depois, de outra criança que nascera a 21 de Dezembro, em Lisboa. 
Cresceram a par. Pelos verões e natais, nas vindas do menino à aldeia, nas brincadeiras de pião e bola de borracha que trazia da cidade e o cachopo chutava com os pés descalços; pelas festas da padroeira, que eram depois das vindimas, beberam juntos os primeiros copos de água-pé; os olhos dos dois rapazes confundiram-se nos seios das moças que cresciam debaixo das blusas, antes mesmo das mães cuidarem de as alargar. Muito se riram os dois e tanto se encontraram nas suas diferenças.
Um dia, pelo verão, o mancebo da aldeia contou ao da cidade que não iria à guerra, que queria outra vida. No natal desse ano, o jovem que chegava de Lisboa teve a notícia que o fez chorar (então e hoje): balas da Guardia Civil tinham acabado com a vida do amigo, que tanto queria ir começar para lá dos Pirinéus. Já tão perto! 
Zambujal

10. Teresa Silva



Se eu soubesse contar e escrever histórias, contaria Um conto de Natal (A Christmas Carol, no original), de Charles Dickens, publicado em 1843. A partir dele fizeram-se vários filmes, alguns dos quais vejo sempre com agrado.
Teresa Silva

9. Rocha/Desenhamento



Fui protagonista de várias histórias (fictícias) de Natal. Era eu criança. Meu irmão, mais velho, esgueirou-se (no dia de Natal e respectivas prendas) para o quarto dos nossos pais. Disse, com voz tendencial: «Bom dia então não é esta noite que o Pai Natal passa por cá?» Os meus pais entreolharam-se e responderam, olhando de esguelha para a janela. Meu irmão sabia teatrar estas coisas: voltou-se para a porta que abria caminho directo ao corredor, dizendo já fora de campo: «Dizem que Ele está a oferecer canetas Sheaffers.» Fiquei verde; afinal os filhos mais velhos faziam o pedido ao verdadeiro pai Natal como quem sabe, pelos outros, a verdade da mentira em forma de caneta de luxo. O,,,meu irmão recebeu a tal caneta e eu uma caixinha de aguarelas.
Rocha de Sousa

8. Mónica



No primeiro ano da escola primária do meu filho, antes do Natal a professora chamou-me à escola, pensei que ía ouvir um sermão porque o meu filho não sabia quem era o menino Jesus e família (dizia ele em casa: na escola andam para lá a contar uma história de uma menino pobrezinho que nasceu no meio das vacas e que faz anos…), consequência de ser o único que não frequentava as aulas de religião e moral, ou pior, ter repetido na escola algum comentário jocoso sobre religião ouvido em casa, etc. Preparei-me para ser confrontada com o facto de não termos religião e estarmos a educar a criança na heresia, qualquer coisa desta natureza. Encaro a professora e ela com um ar muito triste diz-me: aconteceu uma situação desagradável para o Eduardo que tenho que lhe contar, tenho muita pena mas houve uma "discussão" entre os miúdos sobre o Pai Natal e tive que dizer ao Eduardo a verdade, que não existe o Pai Natal. A professora contou-me que os miúdos começaram a falar do Pai Natal, pedir as prendas ao Pai Natal, quem ainda acredita, quem não acredita, aquelas coisas que os pais dizem se te portares bem o Pai Natal dá-te uma prenda, mas é tudo mentira, são os pais que compram as prendas, até que o meu filho diz que está tudo muito certo mas a verdade é que o Pai Natal todos os anos vai a minha casa, tenho fotografias e tudo! Coitadinho! Bateu-se pela sua convicção, nada como fotografias para provar que existe mesmo! Disse à professora que ficasse tranquila, algum dia tinha que acontecer. Tive pena que fosse desta forma, imaginei-o sozinho contra todos a defender um facto que nós, os pais, a irmã, o tio e as pessoas que convencemos a vestirem-se de Pai Natal, fomos alimentando durante 5 anos. A tática consistia em alguém que saía da sala vestia-se de Pai Natal tocava à porta, nós dizíamos vem aí o Pai Natal, entrava cumprimentava dava-lhe uma prenda tirávamos uma fotografia e ía embora. O miúdo nem tinha tempo de viver a situação, era tudo muito rápido e ele ficava em transe. Recebia uma prenda do Pai Natal, a prenda, e não queria mais nenhuma. Desde esse ano, o primeiro ano na escola primária, que não houve mais Pai Natal. E o Natal nunca mais teve “aquela” magia.
Mónica

7. Mena M.



Num dos dias do Advento, depois de ter ido buscar a minha filha Raquel à Escola Alemã, em Maryland, aproveitei o facto de já estar na rua, a nossa casa ficava numa zona apenas residencial com as lojas mais próximas a uns 10Km, para ir ao Montgomery Mall comprar uma meia dúzia de coisas que me faziam falta, entre elas material escolar. Estando numa papelaria grande aproveitei e comprei também mais 2 rolos de um papel de embrulho de Natal, que achei muito bonito.
Passaram-se os dias e eis que chega a véspera do Natal.
Finalmente chegou a hora de montar pinheiro, que esteve em tempo de espera uns dias na garagem, e decorá-lo não só com as bolas vermelhas, mas também com os enfeites que as crianças fizeram na escola.
As horas pareciam que nunca mais passavam, os meus filhos foram com o pai dar um pequeno passeio e eu fui pôr as prendas à volta da árvore.
Jantámos por volta das 6 e meia da tarde e depois todos correram para a sala para abrir os presentes.
De repente a Raquel, que naquela altura ainda acreditava, ou talvez preferisse fazer de conta de que, disse muito entusiasmada:
- Olha mãe, o Pai Natal comprou o mesmo papel que tu!
Eu prontamente respondi: - Não me admiro nada, era o mais bonito!

Mena

6. Margarida



Seria algo de muito simples, sem qualquer importância.
Apenas uma história banal.
De um pai, uma mãe e um filho.
E do seu burriquito amigo e das estrelas que os guiavam.


Margarida

5. M.



AS CONSULTAS DE QUINTA-FEIRA

Havia anos que os vinte quilómetros de estrada secundária o levavam todas as semanas às consultas de quinta-feira. Grande parte dos seus doentes, por quem sentia um afecto muito especial, vinha do tempo da “periferia”, quando ele e outros colegas ali tinham sido colocados, ao abrigo da política de saúde do governo da altura. Para um rapaz novo, praticamente acabado de sair da faculdade, tinha sido difícil trocar os sonhos de uma carreira médica na capital pela pacatez de um posto de saúde algures numa terra longínqua. O trabalho depressa o fizera compreender a utilidade daquela experiência e o convívio com os colegas trouxera-lhe amizades para a vida inteira. Mais tarde, terminada a “periferia”, mantivera as consultas às quintas-feiras. “Ao menos uma vez por semana vou visitar a família!...”, dizia por graça.
Olha quem ali está, comentou para consigo. O Ti Manel e as suas vinhas! Há que meses não o via. Ainda bem, era sinal de saúde. Aparecera-lhe no consultório por alturas do último Natal, não que estivesse doente, o homem era rijo: “Venho desejar-lhe Boas Festas e oferecer-lhe duas garrafinhas de vinho para o Senhor Doutor beber com a sua senhora.” Buzinou e acenou-lhe através da janela.
- Bom dia Nelson, como vai? - disse, ao passar junto do porteiro do Centro de Saúde - Hoje há muita gente para mim?
- Bom dia Doutor Brandão! Alguma... Começa o inverno, aparecem os espirros...
- O pior é se não tenho lenços suficientes para os espirros da alma...
M

4. Luisa



Natal na minha terra durante os largos anos da segunda guerra mundial:
- sapatinho na chaminé mas quase vazio porque nada havia para comprar
- luzes, apenas os holofotes da Base Aérea de Ota a varrer o céu à procura de possíveis aviões inimigos
- Missa do Galo inexistente porque o Prior era velhinho
- Presépio feito com pedras do quintal e musgo da beira-rio
- Mantinha-se o jantar do dia de Natal, em família, embora pouco houvesse para pôr na mesa.
No entanto, éramos felizes.
Luisa

3. Licínia



Ela sempre começava assim:
Pensava que fosses tu e foi por isso que não reagi mais depressa. A mala a fugir-me do ombro, eu a voltar-me e não eras tu”.
Ele sempre replicava:
Porque é que havia de ser eu?”
E enfastiado:
E se fosse, por que raio ia puxar-te a mala?”
Nesse ponto da conversa, ela continuava e ele ouvia, ou não ouvia, que era mais habitual abrir o jornal, por os óculos e limitar-se a pontuar o monólogo com ”um um”, “am am”, mais espaçados à medida que a fala avançava. Ela parecia não se importar, sentava-se, cruzava as pernas e entusiasmava-se a contar pela milésima vez o que lhe acontecera naquele ano, uns dias antes do Natal. Nessa altura, já não era ele que ali estava, molengão, desinteressado, a puxar por cigarro após cigarro. O outro olhava-a atentamente, seguia-lhe os gestos, bem expressiva a achava e ainda atraente, as rugas aos cantos dos olhos a darem-lhe um encanto de fruta madura. A expressão do outro, o interesse do outro, a graça com que o outro ajeitava a melena, inspiravam-lhe o conto que o Natal lhe trouxera, há uns anos, ao ser surpreendida pelo meliante que lhe sacou a mala e a deixou de mãos vazias, assustada, a gritar, sim, a gritar, a plenos pulmões, que o agarrassem, que era ladrão, que era ladrão, sem que ninguém se aproximasse. Nem imaginavam como se sentira só e desamparada, sem nada na mão, uma mulher sem uma mala na mão é como se estivesse despida. Aí ele costumava dizer “pois”, e virava a página do jornal. O outro tinha um sorriso maroto, ela fazia de conta que não notava e continuava. Quando conseguiu chegar à esquadra, muito afogueada, a contar em catadupa de palavras o que lhe acontecera, vítima de um assalto, ali, senhor guarda, agora mesmo, ninguém acudiu, ali, ao pé do jardim, senhor guarda. Ele interrompia-a, com enfado:
Sim, já contaste, o guarda disse para te calares e te sentares e só depois de acalmares começou a tomar nota da ocorrência, não foi?”
E voltava ao jornal, agora de página dobrada ao meio, a apagar o cigarro. Ela sentia um friozinho no estômago, pensava em calar-se, levantar-se, sair, mas logo o outro a perguntar, já mais perto dela:
E então, como foi?”
Era por isso que arranjava coragem para acabar o seu conto de Natal, a dizer que a mala tinha aparecido, sem dinheiro, claro, mas com os documentos todos, o que já não foi tão mau. Era por isso que não chorava quando ele resmungava:
Agora só para o ano é que voltas a contar essa treta, OK?”
O outro lá estava, a dizer:
Tens de me contar tudo outra vez. Com mais pormenores”.
Ajeitava a melena. O jornal continuava. Ela não saía.
Licínia
(A foto foi tirada no Museu da Fundação Folon, perto de Bruxelas)