quinta-feira, março 08, 2018

6. M.



As crianças que fomos vivem para sempre connosco dentro do conjunto de assoalhadas que nos compõem. Aninham-se no pensamento e mostram-se ao longo da nossa vida de crescidos na continuidade dos sentimentos, dos gestos, das atitudes, ou de si fogem deitando paredes abaixo para construir outros modelos de arquitecturas, outros espaços.
Mas no mundo de conflitos que nos rodeia, pergunto-me que adultos virão a ser os meninos das guerras dos adultos. Sejam elas quais forem, dentro ou fora de casa, na família ou fora dela, na memória dos ódios, no vazio deixado pelas perdas, no pó dos escombros, na fuga sem esperança. Talvez sejam apenas salvos da sua infância amargurada por alguma coisa boa guardada no seu íntimo que os acompanhará para sempre. Talvez o toque delicado de alguém, um beijo, o olhar de ternura pousado sobre a dor adivinhada, uma palavra doce deixada no ouvido em ferida lhes preserve a candura possível perante a crueldade de que a humanidade também é capaz. Talvez.
M

4 comentários:

Isabel disse...

Comoveu-me o teu texto. Na minha sala de aula há algumas crianças que precisam ser salvas dessa amargura. Eu sei que o meu papel para ajudar é fundamental mas com um enorme cansaço instalado, sei que não tenho conseguido fazê-lo da melhor maneira.
E gosto tanto dos meus meninos.

Anónimo disse...

Às vezes uma pequena recordação poderá ligá-los à infância perdida. Um brinquedo, uma pedrinha, um fato (Luisa)

Justine disse...

Talvez! eu penso, quero pensar, que as crianças, por instinto de sobrevivência, encontram sempre modo de subverter a realidade, transformando-a no mundo maravilhoso que a imaginação cria. Quero acreditar nisso, de outro modo o mundo daqui a 20 anos não será um mundo humano...

mena maya disse...

Excelente reflexão com as palavras que sempre encontras dentro de ti.
Que sim, que tenham sempre uma referência, que as conforte nos momentos mais difíceis.