Era dia e Penélope
tecia. Esperava e tecia e a idade crescia. E a raiva crescia e a cama
vazia e a cidade vazia. Quando a noite chegava, a teia minguava,
Penélope chorava, na cidade chovia. Ulisses navegava, Ulisses
naufragava, Ulisses não cuidava, Ulisses não sabia, Ulisses não
voltava e a teia não crescia. Outro esposo Penélope não queria,
outro rei, outra lei a cidade não queria. Ainda ela tecia e Ulisses
voltou e ninguém reparou como Ulisses mudou, como Ulisses sofria,
como Ulisses chorou. Só o cão o cheirou, só o cão se deitou na
velhice de Ulisses. Era noite e a teia encolhia, e outro dia haveria
de a teia terminar, de Ulisses regressar ao seu trono vazio, às mãos
da tecelã, sem tecer, sem tecer, a mirar, a mirar, a velhice de
Ulisses, o cansaço de Ulisses, o cão fiel de Ulisses. Na cidade
chovia.
Licínia
1 comentário:
Fiquei sem palavras, perante esta pérola que é o teu texto!
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