Ao fitar esta imagem fico com ela, provisoriamente, dentro do olhar. Logo ela se resolve no fundo da memória e passo a saber que estou diante de um vitral ou parte dele. Coisa que não vem das longínquas oficinas da antiguidade, mestres ao lado de Chartres, a cortar os vidros segundo um desenho e uma estrura para o chumbo, riscando com delicados pincéis e operando sombras através de um pó apropriado. Tudo para entrar no forno e ser montado mais tarde, depois da cozedura, em grades de ferro, os vidros coloridos brilhando e as sombras, plasmadas pelo "grisé", modelando a ideia visual do claro-escuro. Grelha apertada consoante a fragilidade do pormenor ou mais aberta na largueza das formas. Destas coisas fala a memória perante este vitral menos inventivo, abstracto, que explora pouco a força da passagem da luz através da transparência. Imagino que os vitrais, aparentemente saturados de cor "sinfónica", são uma espécie de tradutores da luz branca vinda do exterior para, tornando-a pintura em luz cromática, a passar habitualmente do exterior para a sombra dos espaços interiores, conferindo-lhes uma espécie de vibração sacra.
Rocha de Sousa
2 comentários:
Interessante, a comparação entre a técnica e resultados antigos e este trabalho moderno. Também a mim me apeteceu a comparação...
Também é giro saber, desta descrição da feitura dos vitrais. Como tantas vezes, RD "desmonta os gestos artísticos" com o conhecimento provável que lhe advém "de fazer a arte" passo a passo. E pode-se encontrar a beleza, ainda assim, na bata suja de tinta do pintor, no pó que gravita à volta do escultor e nos dedos que acertam azulejos... enfim!
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