quarta-feira, junho 27, 2007

A "História de Um pássaro com Sorte", contada pela L.


Aconteceu anteontem de manhã. A nossa Minie* encontrou um pequeno pássaro e trouxe-o para a cama de verga onde dorme as suas sestas e onde gosta de guardar os seus tesouros: ossos, paus, coisas interessantes que não quer enterrar e que nós fazemos desaparecer discretamente.

Fomos rapidamente tirar-lhe o pássaro, que a julgar pelo aspecto, pensei não iria durar mais do que cinco minutos. Estava gelado, de olhos fechados, abria e fechava o bico, sinais evidentes de muito mau estado. Era tão pequeno que nem peso tinha.

Consegui aquecê-lo e depois fornecer-lhe alguma energia com gotas de água açucarada (sem saber se estava a fazer uma grande asneira) e ao fim de bastante tempo já se sacudia incomodado com o calor, abria um olho, depois outro, mas continuava muito debilitado.

Deixei-o ficar entre papel macio, para conservar o calor, mas nunca esperando que recuperasse.

Quando voltei para ver como estava, já não o encontrei na caixa onde o deixara. Saíra e escondera-se muito perto, abrigado num canto. Temos pássaro, pensei. O pior era a alimentação e para isso precisava saber de que pássaro se tratava. Verdilhão, disseram-me. Fui procurar o que comem. São vegetarianos. Muito bem, sementes, fruta. Mas o passarito não queria nada a não ser uma gota de água açucarada de vez em quando. Depois passou a papa de flocos muito líquida, em forma de gota. Ganhou força e energia e passou de inerte a muito arrebitado. Não voava mas punha-se na beira da caixa e saltava para fora dela com as prováveis consequências para um tão pequeno ser. Não contando com a Minie que estava longe por precaução. Olhava-me sem nenhum medo e com bastante curiosidade. Ainda não tinha aprendido com os pais que os seres humanos nem sempre são de confiança.

Começou a chamar os pais, com um trinar quase inaudível e constante, que acabei por decorar.

Foi então que me lembrei de o colocar no parapeito de uma janela, onde ficou a olhar para o jardim, muito quieto no bordo da caixa e sempre a chamar.

A certa altura, já por volta do meio-dia, vi um verdilhão adulto no relvado, obviamente atento ao chamamento. Só podia ser um dos progenitores e assim sendo, uma vez que o pequeno já estava recuperado, deixei-o em cima da relva e fiquei a ver de longe o que iria acontecer.

As cenas seguintes foram as normais: um passarito de asas e bico aberto e os dois pais a darem-lhe comida. Tinham-se encontrado o que me aliviou bastante.

Tinha-se acabado o papel de ama-seca. Mas não deixei de o vigiar e o que se passava não me tranquilizava, porque o pequeno corria pelo relvado, quase invisível, como se fosse aquele o modo de se locomover normalmente e de vez em quando apareciam os pais e lá se repetia a cena da alimentação. Do mal, o menos, comida tinha.

Estiveram assim até ao entardecer, altura em que perdi o sinal sonoro. Fiquei sem saber se tinha desaparecido por qualquer motivo, ou se tinha chegado a hora do recolher e estava escondido em qualquer lugar. Muito procurei sem resultado e deixei para hoje. Quando houvesse sol e calor, haveria de ter algum sinal. Sem muitas esperanças, porque as noites ainda estão frias.

Mas, por volta das duas horas, ouvi o som de chamamento. Lá estava ele no chão, de pescoço esticado, vendo o ambiente, sempre a pedir alguma coisa através do seu constante chamamento. Logo que me pressentiu levantou voo e pousou na árvore mais próxima, sem me dar oportunidade de o fotografar.

Aprendeu a voar e espero que se emancipe de vez.

Um final feliz para um verdilhão que não queria aprender a voar, ou que caiu do ninho cedo demais.

*A Minie é uma cadelinha Cocker-Spagniel, que já apareceu numa fotografia do jogo Foto-Dicionário.

L.

http://fazendocaminho.blogspot.com


4 comentários:

Anónimo disse...

Ainda com um ar muito amarrotado, mas decidido!
Que sorte para ele teres sido o seu anjo de guarda! O mais provável é ter caído do ninho...
Que história linda!
:-)

Frioleiras disse...

Adoro pássaros... (tenho uma enorme fragilidade por eles... são de todos os animais os que maior ternura me despertam....)

Passei por aqui para... te enviar um bj

Manuela

Zé-Viajante disse...

São pequenos gestos destes que ainda nos fazem acreditar na Humanidade

None disse...

Mena, o ar amarrotado é devido à penugem por ser tão pequeno...
Zé-Viajante, quando está ao nosso alcance e fazemos a escolha, estes gestos são possíveis, mas quantos nos passam ao lado por distracção, por indiferença, por incapacidade?