Eras muito velhinho, a vida já te sobrava, e dizias, no teu jeito de brincar:
- Estão esquecidos de mim.
Tinham partido há muito os teus amigos, o teu espaço ia-se confinando à exiguidade dos teus passos, os teus cinco sentidos iam perdendo a agudeza. Tu apercebias-te disso, mas aceitavas. Sem lamentos, dizias:
- É assim mesmo, sou muito velho.
Não sei bem em que dia de Janeiro morreste, o mesmo mês em que nasceste, não presto para fixar datas tristes. Talvez fosse no dia vinte, talvez, mas que interessa isso, se o que vou fixar para sempre é a tua bondade, a tua inteligência, a tua honestidade, sem data marcada no meu coração.
Quando escrevo versos, embora não sejam decassílabos, recordo no ouvido interno aquela música que nascia enquanto me ensinavas a escandir, tão-ce-do-des-ta-vi-da-des-con-ten...
Como se hoje fosse um dia do Pai.
(excerto de texto incluído em livro a aparecer em Abril)
Licínia
2 comentários:
Belo texto a acompanhar uma bonita fotografia dum Pai que escreve, tal como, mais tarde, a filha
Luisa
Excelente texto, Licínia!
Enviar um comentário