quinta-feira, julho 19, 2012

11. Rocha/Desenhamento

A porta, ainda viva e tratada, encerra uma casa antiga e modesta, pode estar a dizer-nos que alguém a fechou e saíu ou que a fechou depois de entrar. Alguém viverá isoladamente nesta pequena casa, lugar que nos deixa uma ideia de solidão, de interioridade, vida mais encoberta do que descoberta? Ou silêncio e vazio. Olhar e ver o real é um trajecto conceptual enganador. Um dia, fotografando casas arruinadas de uma aldeia do Algarve serrano, registei muitas portas fechadas, secas, rodeadas de um silêncio de assombro. Num caso, a porta ainda lembrava o seu vai-vem, entradas e saídas. Apetecia abrir a porta, espreitar, chamar por alguém. A porta cedeu facilmente, madeira rangendo por si e no chão. «Está alguém aí?»
Ninguém respondeu. Poeirenta e sombria por dentro, nunca ninguém mais responderia ao chamamento. Nem os ratos no rumor das suas furtivas corridas.
A imagem que vemos parece revelar a conservação da porta e a habitabilidade do seu interior, num contexto antigo e poético.
Olhar, ver, compreender. A percepção visual, por vezes, muitas vezes, parece revelar-nos uma coisa que não passa, afinal, do seu contrário.
Rocha de Sousa

1 comentário:

bettips disse...

Gostei desta (des)focagem de olhar.