Dia
27 - Fotografando
as palavras de outros sobre
este excerto do início de um livro muito interessante (apesar de a
tradução não me agradar):
«Na
pequena pensão da Riviera, onde vivi antes da guerra, há uns dez
anos, rebentou uma acesa discussão à nossa mesa, ameaçando
degenerar inesperadamente numa altercação carregada de raiva, ódio
e insultos até. A imaginação da maior parte das pessoas é tosca,
aquilo que não as atinge directamente, que, qual espigão aguçado,
não as toca profundamente, mal pode deixá-las impressionadas. Mas
se alguma coisa acontece, mesmo ali à sua frente, por mais
insignificante que seja, desde que ao alcance do seu sentir imediato,
deixam uma paixão desmesurada tomar logo posse de si. Em certa
medida, substituem o escasso interesse por uma impetuosidade
despropositada.
Também
desta vez aconteceu assim com a nossa tertúlia exclusivamente
oriunda de uma burguesia que cultivava as mais das vezes o
small talk e
o entretém superficial e breve e que frequentemente se desfazia
logo, mal a mesa era levantada: o casal de alemães em excursão e
fotógrafo-amador, o dinamarquês anafado e apreciador das pescarias
enfadonhas, a distinta senhora inglesa com os seus livros, o casal de
italianos em escapadela para Monte Carlo e eu, preguiçando numa
cadeira de jardim ou trabalhando. Contudo, desta vez, insurgimo-nos
todos uns contra os outros, por causa de azeda discussão; e quando
um de nós se levantou inusitadamente, não foi por estar
educadamente a despedir-se, como sempre acontecia, mas porque a
exasperação a quente assumiu, exactamente como acabo de relatar,
forma de fúria.»
Vinte
e quatro horas na vida de uma mulher, Stefan
Zweig, Editora A Esfera dos Livros, 2008
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