Entretenho-me a espreitar o meu entretenimento adiado. Nem sei se o que está ali fotografado é a frase do ano, como diz. Não gosto que haja frases do ano, talvez. Mas reconheço que sim, que seja uma frase grande e verdadeira, como por vezes ainda podem ser as palavras - como montanhas.
E por isso, vou ao redor, saio desses baços olhos inexpressivos, deste destroço camuflado, da lamela onde o mundo se vai amarfanhando e encolhendo, sob a gigantesca espátula invisível e fantasmagórica onde habitamos estes breves instantes.
E por isso, vou ao redor, saio desses baços olhos inexpressivos, deste destroço camuflado, da lamela onde o mundo se vai amarfanhando e encolhendo, sob a gigantesca espátula invisível e fantasmagórica onde habitamos estes breves instantes.
Saio e logo sou um rio que canta e um colo no fim do dia, a cereja que dança na brisa tremida: debruada a renda, simples como malha de ternura, enrolados nós ( quantos somos? ) em meada, subjacendo sinfonias.
Na ponta dos dedos, um fio de água, um fio de apalavrado, sulco onde nasça e onde beba, num amanhecer secreto de fonte perdida na memória do ninho, ou moinho à escuta, ou mão de pai, ou baloiço, ou lençol de nuvens, ou amoras de sangue clandestino, indecifrados sinos.
Sem vestígios de sede suplementar, papoila me seja em casa de madeira e cristal e branco cheiro a jasmim - com os pés no chão e asas perfiladas, sinuosa e subtil como serpente e pesada de leveza como grifo.
~pi
4 comentários:
Foi assim que aconteceu. Criaram-nos falsas necessidades, obrigaram-nos a competir no ajuntamento de inutilidades, sufocaram-nos de acessórios, na vã presunção de sermos maiores do que os outros. E aí esquecemos, na verdade, os outros e as suas reais necessidades. Esquecemo-nos também de nós, submersos na fancaria dos costumes, ignorando os verdadeiros bens que nos confortam e enriquecem.
Fazemos bem em "sair" destas frases do dia e aproveitar para gozar o que ainda nos deixaram gozar: a natureza.
A frase é bem verdadeira - e quiçá assustadora!
Gosto destes espanhóis, assertivos. As frases sentimo-las nós também, todos os dias, no roubo.
A palavra deste ano (quiçá de outros) é de ladrões.
O resto que espreito em ~pi ... é uma ave ligeira
que se solta.
(vai lá dentro ver, onde há livros há arte e nunca se desperdiça!)
Enviar um comentário