PARA UM RETRATO
Texto e desenho digital: Rocha de Sousa
Este é o retrato do José Xana, um moço que vi chegar a homem, na minha terra, com a mesma cara de sempre, seca, amarelada, coberta por um olhar melancólico, supondo não se sabia o quê, algum entardecer, as ruas vazias, talvez o rolar de memórias desfocadas de uma infância antecipando a adolescência e a juventude e os seus derradeiros sessenta anos.
O José Xana, órfão e só, vivia da sua bondade. Porque essa bondade atraía a bondade solidária de muitos outros. Lembrava-se deles todos, nomes, famílias, modo de vida. Falava pelos nomes, dizia coisas sem sentido, bonitas, e perguntava aos outros do bem estar deles, dos meninos, das meninas, apertando as mãos uma na outra. Este estranho ser que viveu sempre em Silves, sempre certo de quem chegava e ao que vinha, era alimentado e vestido por um grande número de pessoas da terra. Aceitava tudo sorrindo.
Quando alguém morria, logo o Xana aparecia: ficava a noite no Velório e acompanhava o falecido, um pouco atrás de toda a gente, no funeral, o percurso inteiro até ao cemitério. Como devemos classificar este santo imperfeito, ou talvez inteiro e sem explicação, que morreu entre os que amava e o amavam, entre os que lhe trataram do funeral e dele se despediram sem palavras?
Rocha de Sousa O José Xana, órfão e só, vivia da sua bondade. Porque essa bondade atraía a bondade solidária de muitos outros. Lembrava-se deles todos, nomes, famílias, modo de vida. Falava pelos nomes, dizia coisas sem sentido, bonitas, e perguntava aos outros do bem estar deles, dos meninos, das meninas, apertando as mãos uma na outra. Este estranho ser que viveu sempre em Silves, sempre certo de quem chegava e ao que vinha, era alimentado e vestido por um grande número de pessoas da terra. Aceitava tudo sorrindo.
Quando alguém morria, logo o Xana aparecia: ficava a noite no Velório e acompanhava o falecido, um pouco atrás de toda a gente, no funeral, o percurso inteiro até ao cemitério. Como devemos classificar este santo imperfeito, ou talvez inteiro e sem explicação, que morreu entre os que amava e o amavam, entre os que lhe trataram do funeral e dele se despediram sem palavras?
Nota: esta narrativa não é ficcional: sintetiza a longa presença de um ser vivo, deficiente mental, que muita gente amparou como se diz, durante perto de sessenta anos, em Silves.
4 comentários:
Um retrato de um humanismo tocante. Que fala de solidariedade, simplicidade, vida vivida a sério.
A fotografia é muito expressiva!
Comovente, retrato e explicação.
Da não-ficção de algumas pobres vidas. Ricas de Humanidade.
Uma fotografia que exprime de forma muito intensa o texto. Ambos cheios de beleza e humanidade.
Retrato dum pobre generoso ou de um generoso pobre, que nos faz pensar.
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