no tempo do gelo ardente
na noite de fogo e lobo
depois de ter abatido
a corça mais inocente
com setas feitas de pedra
com arcos feitos de pau
com força feita de fome
o homem se levantou
da esteira da solidão
e às paredes da gruta
traços e voltas lançou
e com eles se encantou
e os traços multiplicou
e os traços deram as vozes
e as voltas deram as danças
e as danças eram de gente
e a gente era igual ao homem
que outro homem descobriu
nas pedras onde dançavam
as voltas que ali traçou
e com elas se amigou
e ao outro dia chegou
uma mulher que passou
a mão nos traços e voltas
e se aconchegou na esteira
com o homem que inventou
do amor a carta primeira
Nota: A primeira foto é recorte de uma “Caligrafia” da autoria de Ariana Andrade. A segunda é de um rochedo com grutas, algures no Gerês, onde Ariana, em criança, sem saber ainda escrever, desenhava com pedra sobre pedra rabiscos que hoje rememora nos seus grafismos. O poema é meu.
O homem da pré-história revive cada vez que um homem ou mulher de hoje inscreve na pedra os seus pensamentos. Foi o que me ocorreu apresentar.
Licínia
5 comentários:
Belíssima apresentação, Licínia, com a poesia dentro da humanidade mesmo antes de ela disso ter consciência, como disse o Zambujal
Muito belos: texto e imagens.
M.
De grande beleza as fotografias e o poema.
Teresa
Incríveis são as memórias e o que elas (nos)significam. Belas, as palavras-poema inicial, figuras quase de arte rupestre.
Tudo magnífico mas principalmente o poema
Luisa
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