quarta-feira, fevereiro 14, 2024

4. Licínia

 

HELENA

Foi um prazer tão fundo

ter-te conhecido.

De ti sabia vagamente as linhas,

as janelas de prédios em ruas labirinto,

com lugar para um cravo ou um rosto

envergonhado por trás de um cortinado.

Mas hoje vi-te

e os meus olhos ganharam a garra

que dos teus se desprendia.

E já não era eu, mas tu, Helena,

que em mim se revelava.

Abri os livros das bibliotecas

e encharquei-me de vidas e de mundos.

Contigo percorri cidades,

subi escadas, desci cordas,

atravessei fronteiras, dobrei esquinas

da memória finalmente desperta.

E os teus olhos, Helena, que viram

para além do que havia para ver.

E as tuas mãos a semear

as cores, os traços, os volumes,

o infinito que, suponho,

só pudeste pensar com pessoas por dentro.

Que sorte a minha quando te encontrei

no metropolitano acabado de pintar.

Licínia

(Junho de 2004, escrito a pensar na exposição sobre Vieira-Arpad que acabara de ver na Casa Arpad Szenes)

 

5 comentários:

M. disse...

Palavras muito fortes a projectarem em nós o que sentiste tão vivamente. Bem entendo o teu entusiasmo. Ganha-se vida quando assim acontece.

bettips disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
bettips disse...

Lindo, o sentimento vertiginoso da arte que descreves tão bem!

bettips disse...

Fiz aqui um comentário que não aparece!
Enfim...
Muito belo o sentimento poético que te despertou a visita.

Justine disse...

O teu poema tem ritmo e beleza, que retratam as pinturas-poemas de VdS. O teu poema dá-se muito bem ao lado da pintura de VdS