Naquilo de que nunca nos separaremos – boa questão que me pus quando há dias acordei com a cama a abanar e percebi que era um sismo. Em poucos segundos pensei se isto abana outra vez devia ir para a rua, vestir qualquer coisa mais apropriada do que o pijama, vestir o máximo de coisas, sapatos, botas, levar um casaco, escova de dentes, uma muda de roupa interior. Daqui num pulo vou à sala e o que levo, uma faca, um livro, uma fotografia, a minha carteira, o meu passaporte, em que saco meto as coisas, a minha mantinha, champô, sabonete, uma toalha, o meu telemóvel, um frasco de atum que depois de lavado serve de recipiente, um litro de leite sem lactose. E o meu computador, o meu disco externo com todas as minhas fotografias, não posso deixar para trás as minhas memórias. O sono foi mais forte e adormeci rapidamente. Decidi que aquilo de que nunca me separarei é do meu cartão multibanco. Será que devia dormir com o cartão multibanco na cabeceira? Depois ligo a televisão e vejo as imagens de guerra, dos prédios cortados ao meio, das pessoas em padiolas levadas para hospitais destruídos, das crianças a deambular pelos escombros, com latas à cabeça à procura de água, a comida enlatada que cai do céu. Acho que o melhor é nunca me separar do meu corpo inteiro.
Mónica
7 comentários:
Realmente não vale a pena levar nada. Enquanto preparamos qualquer coisa, pode cair-nos o teto em cima. Eu levaria apenas o maço de cigarros
Luisa
Uma graça este texto, adoro este teu estilo. Ainda por cima tens razão na conclusão a que chegas.
Primeiro sorri, com os amplos e diversos pensamentos da ensonada... Depois sofri com as coisas que vês e vejo, e sabemos. Porque sinto o mesmo.
Brilhante, Mónica! Adorei a última frase!
Um óptimo texto, como habitualmente. Num caso destes não sei o que levaria, possivelmente nada, para fugir mais depressa. Mas as imagens de horror que nos mostram relativizam os nossos possíveis comportamentos.
Teresa
Texto exemplar, com ritmo e ironia, e muitas verdades! E mostra como tu és uma mulher prevenida::))
(
Mónica, a M. chamou-me a atenção para a minha falta de atenção, pois passei por ti sem te comentar. Desculpa,, mas a minha cabeça ainda não está a trabalhar bem...
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