quinta-feira, janeiro 09, 2025

8. Mónica

Num objeto com história – Não acumulo objectos. Os poucos que tenho é porque preciso ou porque têm uma história, destes a maior parte não conheço a história, só sei a quem pertenceram e por correlação presumo que sabem mais do que eu sei deles. Uma espécie de meus antepassados ilegais, sem registos de nascimento/batismo, casamento ou óbito. Sei que um desses objectos foi a minha mantinha desde que me conheço a identificar mantas, esta é “A minha mantinha”, não sei quando terá nascido, a minha mãe nunca me disse de onde veio, se calhar tal como eu não foi batizada, não sei. Não casou, isso sei. Viveu sempre comigo, quando eu estava casada ia para o armário, quando me divorciava e tinha que mudar de casa, metia-a na mala, lavava-a do mofo e punha-a a uso. Num desses descasa, ficou a viver com o meu filho, adotou-o, portanto posso dizer que a minha mantinha teve um filho, que muito a estimou e fez companhia. Perdi-lhe o rasto da vida mas manteve-se com a família que criou outra família, já estava numa idade, uma textura, uma descoloração que não faz a cobiça de ninguém. Voltou para mim há uns anos. Passa a maior parte do ano na gaveta das mantinhas de inverno para nos aquecer nas noites frias de televisão. Bem cheirosa, todos os anos antes do verão meto-a na máquina de lavar, toma um banho de sol e volta para a gaveta. Neste momento está ali desalinhada no sofá de pau, à espera que eu acabe isto para me ir enrolar nela. “A minha mantinha” de seu nome. Nem aos objectos me prendo, ela voltou para mim não voltou?

Mónica

6 comentários:

Margarida disse...

Tão bonito o texto...

bettips disse...

Uma história à tua maneira, aconchegante: história das coisas perdidas e sem nome próprio. Muito tua.

Anónimo disse...

Mas afinal sempre estás presa a algum objecto. Gosto da história da mantinha que acabou nos teus joelhos
Luisa

Anónimo disse...

Muito gira a história da mantinha. Foi pena não a teres fotografado para vermos como era.
Teresa

M. disse...

Adorei a história. Sem dúvida muito original e reveladora da tua maneira de ver e sentir o mundo e que eu considero corajosa.

Justine disse...

Mónica, o teu excelente texto poderia ser o início de um livro autobiográfico. A importância da mantinha na tua vida é comovente, o texto não tem nem uma palavra a mais, logo porque não continuares este texto? É uma sugestão...