quarta-feira, novembro 25, 2020

6. M.

A ideia da Mena separar os anos em décadas talvez tenha sido uma boa estratégia para nos ajudar a realçar, dentro do todo que é a existência de cada um de nós, as diversas fases que a vão compondo. A nível oficial começou a minha vinda a este mundo com o registo na cédula pessoal da data do meu nascimento, do meu nome e os dos meus pais, o lugar em que nasci. Neste documento tenho apenas dois assentos, esse e o do meu casamento. Informação fria, burocrática, onde não consta o que fui vivendo e recordando ou o que por vezes esqueci ao longo do tempo. Fora dessas folhas existem sentimentos, alegrias, a começar pela que dei aos meus pais quando nasci, escolas onde não fui compreendida, tristezas, sonhos, desejos, ternuras com filhos e netos, amigos, ilusões e desilusões, indiferenças, recusas, o que aprendi ou nunca conheci, quem toquei ou não, reflexões. Tudo isso não está lá averbado. E, no entanto, são dados importantes, imprescindíveis, fazem parte de mim, preenchem a mochila que me acompanha na minha já longa caminhada neste mundo. Caminhada física e mental na qual incluo em particular nesta década as viagens sonhadas desde sempre que tive a oportunidade de realizar. Foi um tempo bom.

M

5 comentários:

Mónica disse...

está como nova a tua cédula, a minha não tem capa nem assentos de casamento

Licínia Quitério disse...

Uma vida não se regista numa cédula. Os assentos todos estão no teu coração, como bem o demonstras.

Justine disse...

Uma cédula! Que relíquia, M.! nem sei onde possa andar a minha, mas o mais verto é eu tê-la deitado fora num momento de fúria, pois como tão bem diz a Licínia, uma vida não se regista numa cédula

Justine disse...

queria dizer "...o mais certo…"

Anónimo disse...

Bonito texto com base na cédula.

Teresa