quarta-feira, maio 31, 2023

9. Mónica

O tema deste mês é para mim e para o meu vício de genealogia. Como já aqui falei dos meus avós, peço desculpa ao Zé Viajante, ver em PPP 21/04/2022 os meus avós maternos e PPP 16/03/2023 a minha avó paterna, vou puxar pelo assunto que me interessa e dá prazer. O meu avô descrito também em PPP 14/04/2022 (nascido em Alcântara, Lisboa em 1910 e óbito em Oeiras 1995), é filho de Custódio Maria Rafael (nascido em 1875 e óbito na Rua Rosa Damasceno em Lisboa algures pelos anos 60 do século passado, ainda não encontrei a certidão de óbito), que é filho do Manuel José Parrana (nascido em 1843 e óbito ainda não encontrei), que é filho do José António Massano (nascido em ano de páginas danificadas do arquivo e óbito em 1861), que é filho do Francisco Leal Massano (batizado em 1782 e óbito ainda não encontrei) que é filho do José António Massano (como o mesmo nome do outro, batizado em 1732 e óbito em 1816), que é filho do Manuel Baião e da Cecília Baioa (óbito em 1783). Salvo as exceções que refiro todos nasceram, foram batizados, casaram e morrem com registo na igreja da paróquia de Ervidel, conselho de Aljustrel, distrito de Beja, até ao último casal que desconheço mais informações porque começaram nessa data os registos nesta paróquia, presumo que os de sangue azul terão tratado das suas árvores genealógicas com outro cuidado e antiguidade. Isto pela linha paterna, poupo-vos às linhas maternas, ufa! Todos estes meus achamentos foram feitos desde há quase dois anos, com muitas horas roubadas ao sono e leitura exaustiva pessoa a pessoa em registos em pdf’s manuscritos, em paleografia, cheios de abreviaturas e códigos, dos arquivos da Torre do Tombo que estão disponíveis on-line gratuitamente. Por causa disto tenho lido sobre o Alentejo, sobre a economia liberal, a economia do Alentejo no século XVIII, uma enciclopédia emprestada sobre o liberalismo que passei os olhos mas vou ter que ler a sério, um dicionário de paleografia para me ajudar a decifrar a escrita, os códigos e abreviaturas, tantas lacunas das aulas de História, essa seca de reis, rainhas, milagres de pão e rosas, que tretas! Todo um mundo para aprender, conjecturar a vida miserável predestinada, endémica, genética, dos meus antepassados alentejanos de Ervidel, quebrada quando o meu bisavô, órfão de mãe aos 3 anos (morreu no parto do 6.º filho) sabe-se lá como foi criado até entrar na marinha (na matrícula está escrito “sabe ler, escrever e contar” e tem cicatrizes na cara) onde andou em comissões pelas ex-colónias, fez o exame da 4.ª classe, casou com uma mulher alta feia de olhos azuis (que veio de gente de Coimbra/Viseu), teve dois filhos que duvido que lhes tenha contado o que lhe poderia esperar por destino: ao filho uma enxada na mão em vez dos salamaleques e continências que teve toda a vida e à filha um casebre para cuidar, lavar roupa ou servir em vez das picas que deu. E assim ganho a minha convicção que estes tempos que vivemos são melhores em tudo, quem fala bem do passado, saudades do antes é que era bom, correto, honesto, etc., é anti acordo ortográfico, enaltece monarquias, tem o liberalismo na ponta da língua, desdenha do politicamente correto, aconselho a leitura dos arquivos de batismo, casamento e óbito da Torre do Tombo, as vidas banalizadas, os recém-nascidos mortos, mortes nos partos, enjeitados, pai desconhecido, “apregoam que são casados”, cigano, escravos sem pai e propriedade de, mendigos, tendeiros, zarolha, coxa, as informações registadas, as mal registadas, as omissões, a letra estapafúrdia e os borrões do padre que as escreveu, o propósito, a prepotência, a ordem social, as pessoas que parecem coisas, a miséria, a miséria, a miséria. Não sabemos nada da boa vida que temos. À memória dos meus avós-antepassados Cecília Baioa e Manuel Baião, tantos filhos pariram que um deles vingou e procriou e assim sucessivamente, do sobrevivente em cada geração até mim, parece que os sinto e os conheço, e daqui em diante só não continua o ADN dos dois Baiões se alguém interromper, por escolha e não por força das circunstâncias.

Mónica

8 comentários:

Margarida disse...

Bom, pesquisa exaustiva! É preciso gostar mesmo. Gostei do Baião e da Baioa. Excelente trabalho, Mónica

Licínia Quitério disse...

Felicito-te pelo trabalho, pelo interesse da História que tão mal nos foi ensinada.

Anónimo disse...

Também eu gastei muitas horas com essas descobertas e pasmei com os diversos tratamentos que se davam às pessoas: profissão mendigo, cavador preto, dona se era da burguesia.
Luisa

Mónica disse...

obrigada pelas informações Luísa, ainda não apanhei esses termos. parece-me que Ervidel era mesmo "deprimente", há localidades em que a partir de certa data há impressos próprios e a linguagem é mais objetiva. Perde-se em riqueza de informação mas ganha-se em tratamento mais digno das pessoas.

o livro é Economia...século XIX.

O que eu gostava mesmo era de deixar de trabalhar e dedicar-me a isto

M. disse...

Notável essa tua pesquisa pela história dos teus antepassados. Seja lá onde estiverem, poderá ser gratificante para eles tomarem conhecimento de que há alguém da família que se interessou por saber da sua passagem por este mundo. Se isso for possível, claro, sabemos lá nós dos mistérios da vida que nos cabe.

Justine disse...

Pesquisa exaustiva e interessantíssima, Mónica! Admiro e compreendo o teu trabalho e o prazer que ele te dá, pois eu seria incapaz de me meter numa aventura destas...
Aprendi muitas coisas com a leitura do teu texto

Justine disse...

Pesquisa exaustiva e interessantíssima, Mónica! Admiro e compreendo o teu trabalho e o prazer que ele te dá, pois eu seria incapaz de me meter numa aventura destas...
Aprendi muitas coisas com a leitura do teu texto

Anónimo disse...

Notável!!!
Só acrescento que estivemos em Ervidel há alguns anos, com M., naquelas passagens pelo Alentejo adiante, sabíamos lá nós que Cecília e Manuel iriam dar e levar a uma Mónica actual de ideias tão especiais... E que a iríamos encontrar às voltas da árvore e das raízes.
Abçs
B